segunda-feira, março 14, 2011

Vitória do atraso político

Os partidos atuais insistem em ser desimportantes e primam por desprezar lideranças que poderiam ter um papel modernizador, sufocando-as com ambições paroquiais ou regionais

Quem tem alguma idade e boa memória se lembra de uma época em que a economia brasileira era dominada por alguns demônios persistentes: o desabastecimento periódico do leite, da carne; os congelamentos e tabelamentos, o contingenciamento de exportações e de importações, o populismo salarial e sindical e a inflação absolutamente descontrolada. Nada disso existe mais. Aprendemos a desconfiar de fórmulas milagrosas de exorcismos para afugentar esses demônios, como o Plano Cruzado, o Plano Feijão com Arroz, o Plano Collor e outras tolices e tragédias. Aprendemos que exportar se consegue com competitividade e não depende, necessariamente, de uma paridade cambial favorável, que ajuda, mas não é indispensável, como prova o Japão há mais de trinta anos. E aprendemos que dar calote nos outros transforma os caloteiros em párias do mercado financeiro, como a Argentina está sabendo há quase dez anos.

O desfile das escolas de samba demonstra que também aprendemos em outras áreas, como a observância dos horários e dos calendários, o rigor dos detalhes e a perfeição dos conjuntos, a canalização da imaginação criativa e a riqueza do conhecimento empírico disseminado na população que teve menos oportunidades de educação formal. Em um país em que as unidades de tempo mais utilizadas são “qualquer dia desses”, “depois do Carnaval”, “na semana que vem” e “amanhã, mas não garanto”, mais de 60 mil figurantes desfilam em exatos 80 minutos, sem correrias nem atrasos, com fantasias impecáveis e carros alegóricos holywoodianos, movidos a feijão. Um assombro, de encher os olhos. O que Roberto DaMatta chamava de “organizações-cometas”, que têm um pequeno núcleo permanente, ao qual se junta uma enorme cauda na época do carnaval, hoje em dia é uma economia permanente que emprega milhares de pessoas e gera bilhões em faturamento.

Há, porém, uma área em que parecemos não avançar nada, que é a da política. Entra ano, sai ano, os hábitos políticos continuam a surpreender pela desfaçatez e pela imaginação criativa: cada vez que uma prática escandalosa é desnudada na imprensa, os nobres representantes do voto popular encontram outras maneiras de continuar a ordenhar a vaca leiteira do Erário e mamar nas tetas públicas. Os partidos nascem e morrem tratados apenas como animais de montaria temporária. Pensa-se agora, por exemplo, em um novo partido, o PDB, Partido da Democracia Brasileira. Mas, para quê? Para burlar a legislação eleitoral, permitindo que os que migrarem para esse novo aprisco não percam os mandatos por infidelidade partidária. No segundo momento, funde-se o novo partido com um já existente e voilà! , passa-se novamente a perna na Justiça Eleitoral. Um primor de esperteza, só isso.

Enquanto isso, os partidos atuais insistem em ser desimportantes e primam por desprezar lideranças que poderiam ter um papel modernizador, sufocando-as com ambições paroquiais ou regionais. Está acontecendo com Aécio Neves, marginalizado pela oligarquia paulista que, não satisfeita com a surra de 14 milhões de votos que levou de uma estreante em eleições, insiste em perder a próxima. E com Gustavo Fruet aqui em Curitiba, cujos 650 mil votos na capital estão sendo esnobados pelo seu partido, que prefere antecipar o debate eleitoral, fortalecendo as pretensões do atual prefeito Luciano Ducci do PSB. Mas que mal pergunte: os dirigentes de um partido não deveriam fazer força para que ele ganhe as eleições e não um partido concorrente?

Acho Luciano Ducci um ótimo administrador e um político habilíssimo, como demonstrou como secretário de Saúde, que tem todo direito de pretender a prefeitura. Além disso, quem está fazendo a lambança é o PSDB, não ele, que é apenas seu beneficiário. Mas considero um desrespeito com a democracia brasileira que alguém com as credenciais morais e políticas de Fruet e as esperanças dos 650 mil eleitores que votaram nele, sejam jogados no lixo pelas espertezas de campanário de alguns de nossos pais da pátria. É a vitória do atraso e do conchavo.

Belmiro Valverde Jobim Castor é professor do doutorado em Administração da PUCPR.

GAZETA DO POVO - 13/03/2011


Enviado para o "Olho aberto Paraná" pela assessoria de imprensa de Gustavo Fruet

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