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Seis meses após sequestro que durou 130 horas, Tamires Gemelli é ouvida pela Justiça em Erechim



Seis meses após ter sido arrebatada na saída do posto de saúde onde trabalhava, em Erechim, no norte do RS, a médica Tamires Regina Gemelli da Silva Mignoni, 31 anos, falou nesta quinta-feira (29) à Justiça pela primeira vez sobre o sequestro. A ginecologista, que ficou 130 horas em poder dos criminosos, foi resgatada em 21 de outubro do ano passado do cativeiro em Cantagalo, no Paraná. Nesta quinta-feira, detalhou o crime do qual foi vítima.

A primeira a se manifestar na sessão presencial, que teve início às 9h, a médica descreveu, por cerca de duas horas, como foi levada de Erechim e os momentos de terror pelos quais passou: ela foi mantida em dois cativeiros e libertada seis dias depois pela Polícia Civil. Pouco antes da audiência nesta manhã, o juiz Marcos Luis Agostini atendeu ao pedido de Tamires para que os réus não estivessem presentes durante o depoimento dela.

A médica alternou momentos de calma, nos quais descreveu o crime em detalhes, com outros de choro e nervosismo, onde precisou ser amparada e beber água. Desesperou-se ao descrever quando permaneceu por horas em um matagal, sendo ameaçada, e quando foi colocada dentro de um porta-malas, amarrada.

— Ali, mentalmente, ela se despediu porque pensou que ia morrer — contou o pai, Berto Silva.

O CASO

Prefeito de Laranjeiras do Sul, no Paraná, o político também foi ouvido na manhã desta quinta-feira durante a audiência – primeira da fase instrução. Berto falou por cerca de uma hora sobre como foram os dias nos quais a filha foi mantida em cativeiro. Foi com ele que os sequestradores negociaram boa parte do tempo. Os criminosos exigiam que a família pagasse R$ 2 milhões em troca da liberdade de Tamires.

Ao contrário da filha, Berto depôs na presença dos réus — um vigilante e uma mulher respondem pelo crime.

— Tive esse encontro indesejado. Em que pese, eles fossem da minha cidade, nunca tinha tido contato com eles. Não conhecia, somente por fotografia. Foi um momento bem ruim para mim. Mas é um passo para tentarmos virar essa página — afirmou.

Logo após o pai ser ouvido, teve início o depoimento do marido da médica, Lucas Centenaro Mignoni. Ele também manteve contato com os sequestradores ao longo dos pedidos de resgate. Durante a tarde, foi ouvido o delegado Gustavo Villasboas Ceccon, um dos que atuou na investigação do caso, e testemunhou um taxista — ambos de forma presencial.

Audiência encerrada

A previsão era ouvir também mais duas testemunhas e o delegado João Paulo de Abreu, da 1ª Delegacia de Polícia de Repressão a Roubos do Departamento Esta​dual de Investigações Criminais (Deic) – a equipe antissequestro da Polícia Civil do RS. No entanto, esses depoimentos que estavam previstos para ocorrerem por meio de videoconferência não puderam ser realizados, em razão do ataque cibernético ao sistema do Tribunal de Justiça do Estado.

A expectativa era ainda de que os dois réus que respondem presos pelo crime pudessem ser interrogados na audiência. Mas, embora estivessem presencialmente no local, eles só podem ser ouvidos ao final dos outros depoimentos. Com isso, a sessão foi encerrada por volta das 16h e uma nova audiência precisará ser agendada para ouvir as testemunhas e os réus. Ainda não há data definida.

Respondem por extorsão mediante sequestro o vigilante Wilson Roberto Kintof, que morava em Laranjeiras do Sul, no Paraná, município onde o pai da médica é prefeito, e Cirene dos Santos Moraes, apontada pela polícia como a pessoa que ajudou a render Tamires e mantê-la em cativeiro. Kintof é acusado também pelo Ministério Público (MP) como “mentor intelectual e executor principal do crime”. Ele residia nas proximidades da casa da família da médica.

Os dois foram presos em 21 de outubro do ano passado, mesma data na qual a ginecologista foi resgatada pela Polícia Civil em Cantagalo, no Paraná. Um taxista e outra mulher chegaram a ser presos durante a investigação e libertados na sequência. Segundo a polícia, a participação deles no crime foi totalmente descartada.

Contraponto

O advogado Éverton da Silva, responsável pela defesa de Kintof e Cirene, encaminhou nota à reportagem em que afirmava que a participação dos réus no caso será esclarecida no processo e que não concorda com a manutenção da prisão dos dois.

Confira a nota na íntegra:

“A defesa adentrou no feito para representar, num primeiro momento, os interesses da sra. Cirene. Na semana passada, o ex-advogado de Wilson deixou o processo por motivos de foro íntimo, ocasião em que o causídico atual assumiu a defesa técnica dele também. Compreende-se a gravidade do caso e a defesa não ignora os reflexos psíquicos dos quais a vítima se recupera. Torce-se por uma melhora rápida para que retorne, o mais brevê possível, à sua vida habitual.

Tudo o que se refere ao caso e à participação de Cirene dos Santos Moraes e Wilson Roberto Kintof será esclarecido durante o processo. A Defesa se empenhará ao máximo para que nenhuma irregularidade seja cometida durante o processo, garantindo a ampla defesa e contraditório aos seus clientes, princípios indispensáveis de um Estado Democrático de Direito.

A Defesa Técnica não concorda com a prisão de Cirene e Wilson, pois são pessoas com passado irretocável, com família, trabalho, sendo o caso em apreço um fato isolado nas suas vidas. A prisão preventiva é medida excepcional e não pode servir de pena, uma vez que ambos ainda não foram condenados, gozando da plena presunção de inocência. A Defesa se coloca totalmente à disposição da imprensa, meio legítimo para informar à sociedade e, inclusive, combater a espetacularização do caso.”

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