domingo, dezembro 01, 2019

Árvore gigante e mais antiga que o descobrimento do Brasil foi derrubada para virar cerca


Quando a frota de Pedro Álvares Cabral chegou no Brasil em 1500 ela já estava aqui. Ainda era uma jovem, mas estava na terra que séculos depois a elegeu como símbolo daquele Estado. Uma imbuia gigante com cerca de 535 anos de vida que acabou derrubada de forma banal para virar uma simples cerca na porteira de um terreno no Oeste de Santa Catarina.

A árvore com aproximadamente 33 metros de altura foi derrubada em fevereiro do ano passado na zona rural de Vargem Bonita, no Oeste catarinense. Na época, foi encontrada em uma cena de devastação ao lado de outras 16 árvores caídas — a maioria araucárias — em uma área desmatada de 1459 metros quadrados. O proprietário do terreno foi multado pela Polícia Militar Ambiental no valor de R$ 2.750 e a madeira foi apreendida. Pelo cenário encontrado e a característica dos cortes, acredita-se que a madeira seria utilizada na construção de cercas e portões para propriedades rurais.

Com partes da árvore derrubada doadas para um grupo de pesquisadores que estudam árvores gigantes em Santa Catarina, foi possível determinar que a imbuia era muito mais antiga do que o imaginado. O estudo foi feito pela equipe do professor Marcelo Scipioni, engenheiro florestal da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) no campus de Curitibanos. Responsável pelo projeto Árvores Gigantes, ele cataloga espécies como a imbuia e a araucária.

— Fizemos a contagem dos anéis dessa imbuia. Algumas espécies como a imbuia e a araucária marcam os anéis de crescimento ao longo do tempo, e isso está relacionado com o período das estações climáticas, então é possível fazer essa adaptação da idade da árvore. A partir de uma parceria com a PM Ambiental, pedaços dessas árvores que caem por causa da natureza ou por ação criminosa são levados para a universidade e possibilitam esses estudos. É um projeto que leva muito tempo — explica o professor Scipioni.

Assim como a araucária, a imbuia é uma árvore em risco de extinção e, para Scipioni, o uso dela para uma simples cerca é "degradante". Por ter uma madeira densa e muito resistente, o manejo controlado da imbuia pode servir para a fabricação de móveis de alta qualidade. No caso de uma árvore tão antiga como a derrubada em Vargem Bonita, o pesquisador aponta que caso ela caísse naturalmente poderia ser "peça de museu".

— São poucas árvores assim que existem e essa questão criminosa às vezes ocorre até por ignorância. Uma árvore dessas tem um grande valor ambiental, é importante o resgate do estudo delas para mostrar à sociedade como degradamos e alteramos as nossas paisagens. Me deixa preocupado que nas araucárias, por exemplo, querem um plano de manejo sem conhecer o ciclo da espécie. As pessoas estão interessadas em explorar os recursos naturais de uma forma não sustentável — avalia o pesquisador.
Pedaço do tronco da árvore está exposto na frente do quartel da PM Ambiental de Joaçaba(Foto: Divulgação / Polícia Militar Ambiental)

Pedaço que sobrou do tronco está exposto em Joaçaba

O registro do desmatamento das 17 árvores em Vargem Bonita ocorreu após uma denúncia à Polícia Militar Ambiental de Joaçaba, que atende a região. É na frente do quartel da polícia que agora está exposto o que sobrou do tronco da imbuia gigante. A ideia é usar a árvore para educação ambiental na região, conforme o comandante do batalhão da PM Ambiental de Joaçaba, o capitão Celso Paes Mendonça Junior.

— Esse desmatamento ocorreu em uma área na zona rural que não era completamente afastada do perímetro urbano do município. Era uma área de preservação permanente. Agora com o que foi apreendido usamos até na questão de educação, nas ações que realizamos com crianças e adolescentes da região, algo que reflete em toda a comunidade. A ideia é conscientizar, mostrar os impactos do desmatamento desequilibrado — explicou o capitão Paes.
O professor Marcelo Scipioni (de verde) e o professor Mário Tomazello com um anel da imbuia gigante que está exposto na UFSC em Curitibanos(Foto: Arquivo pessoal)

Árvores gigantes

O projeto de árvores gigantes do professor Scipioni já identificou uma série de árvores como a imbuia derrubada em Santa Catarina. Boa parte das árvores enormes e centenárias são araucárias, como a apelidada de "Pinheirão", encontrada em São Joaquim e que tem mais de 3 metros de diâmetro. Com ele atuam pesquisadores parceiros como Mário Tomazello (da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo), Fidel Roig e Cláudia Fontana.

Um trabalho publicado pela equipe de Scipioni em 2017 registrou, após um percurso de mais de 6,8 mil quilômetros em três anos, as últimas 13 araucárias com mais de 2 metros de diâmetro no Sul do Brasil.

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